domingo, 31 de março de 2013
VASO CHINÊS
EstÌanho mimo aqueÌe vaso! Vi-o,
Casualmenteu, ma vez, de um Perfumado
Contador sobre o mármoÌ Ìuzidio,
Entre um leque e o começo de um bordado.
Fino artista chinês, enamorado,
Nele pusera o coração doentio
Em rubras flores de um sutil lavrado,
Na tinta ardente, de um calor sombflo.
Mas, talvez por contraste à desventuÌ4
Quem o sabe?..d. e um velho mandarrm
Também lá estava a singular figura;
Que arte em pintá-lâ! a Sente âcaso vendo-a
Sentia um não sei quê com aquele chim
De olhos cortados à feição de amêndoa
VASO GREGO
Esta de áureos relevos, trabalhada
De divas mãog brilhante copa um dia,
Já de aos deuses seriÌ como cansada
Vinda do Oìimpo, a um novo deus servia.
Era o poeta de Teos que a suspendra
Então, e, oÌa repleta ora esvazada
A taça amiga aos dedos seus tinia
Toda de roxas pétalas colmada.
Depois... Mas o lavor da taça admiÌa
Toca-4 e do ouüdo aproximando-a, às bordas
Finas hás de lhe ouvix, canora e doce,
' Ignota voz, qual se da antiga lira
Fosse a encantada música dâs coÍdas,
Qual se essa voz de Anacreonte Íosse.
NUM TREM DE SUBÚRBIO
No trem de ferro wimo-nos um dia,
I amamo-nos ioi obra de um momento,
Tudo rápido, como a ventania,
Como a locomotiva ou o pensamento.
Amo-te!
- Adoro-te!
A estdçàop rimejra
Surge. Saltamos nela ao sorn de um berro.
Nosso amoX, numa nuvem de poeira,
Tinha passado, como o trem de ferro.
FLOR SANTA
Entre as ruínas de um convento
De uma coluna quebrada
Sobre os destÌoços, ao vento
Vive uma flor isolada.
Através de Íérrea grade
Espiando ao longe e em redor,
Que olhar de amor e saudade
No cálix daquela Ílor!
Diz uma lenda que outrora
Dentre as fÌeiras a mais bel4
Morta âo despontar da aurora,
Fora achada em sua ceÌa.
Ao irem em terra ÍÍia
O Írio corpo depor,
Sobre coluna que havia
A um lado, nascera a flor
E a lenda refere ainda:
Assim que o Ìuar apaÌece,
Da flor animada e linda
No cálix se ouve uma Prece
Reza...E medrosa,e encolhida
A um canto, pálida a cox,
Toda no céu embebid4
Vendo-o, talvez, pobre flot!
Parece, tão branca e pura,
Tão franzina e desmaiada,
Uma fteira em miniatura
Nas pedras ajoelhada.
Resumo do livro: Vestido de Noiva Autor: Nelson Rodrigues
A
peça, Vestido de Noiva, tem, em seu cenário, três planos que se intercalam: o
plano da alucinação, o plano da realidade e o plano da memória. Alaíde, moça
rica da sociedade carioca, é atropelada numa das noites do Rio. No plano da
realidade, jornalistas correm para se informar e publicar em seus jornais o
fato, enquanto médicos correm para salvar o corpo inerte da mulher, jogada numa
mesa de operação, entre a vida e a morte.
No
plano da alucinação, Alaíde procura por uma mulher chamada Madame Clessi, sua
heroína, que foi assassinada no início do século,
vestida de noiva, pelo seu namorado. As duas se encontram e conversam. Um homem
acusa Alaíde de assassina, e ela revela a Madame Clessi que assassinou o marido
Pedro com um ferro após uma discussão.
No
plano da memória reconstitui a cena. Mais tarde, ambas percebem que o
assassinato de Pedro não passou de um sonho de Alaíde. Enquanto os médicos
tentam quase o impossível para salvá-la da morte no plano da realidade, Alaíde
e Madame Clessi conversam no plano da alucinação, tentando se lembrar do dia do
casamento da primeira, e de duas mulheres que estavam presentes enquanto Alaíde
se preparava para a cerimônia. A mulher de véu e uma moça chamada Lúcia. Ambas
são, na verdade, a mesma pessoa, a irmã de Alaíde, que reclama o fato desta ter
lhe roubado o namorado.
Segue-se
uma série de intercalações entre os planos: no plano da realidade, o trabalho
dos médicos para reanimar Alaíde, e dos jornalistas
querendo informações sobre a tragédia do atropelamento. Nos planos da
alucinação e da memória, a história de Madame Clessi, com seu namoro com um
jovem rapaz e sua morte, se funde com a de Alaíde no dia do casamento com
Pedro.
Segue-se
a discussão com Lúcia minutos antes da cerimônia, que a acusa violentamente
de ter lhe roubado o noivo. O casamento acontece, e
Alaíde se vê vítima de uma conspiração entre Lúcia e Pedro, que pretendem
matá-la para ficarem juntos. No plano da realidade, Alaíde morre na mesa de
operação. Enquanto Alaíde assiste com Madame Clessi cenas de seu enterro e de
sua discussão com Lúcia momentos antes do atropelamento, quando jura que mesmo
morta não a deixaria ficar com Pedro. Lúcia, no entanto, casa-se com Pedro,
mesmo tendo em sua mente a imagem de Alaíde com seu vestido de noiva.
sábado, 30 de março de 2013
Vaiamos, irmãa, vaiamos dormir
Vaiamos, irmãa, vaiamos dormir
[en] nas ribas do lago, u eu andar vi
a las aves meu amigo.
Vaiamos,irmãa, vaiamos folgar
[en] nas ribas do lago, u eu vi andar
a las aves meu amigo.
En nas ribas do lago, u eu andar vi,
seu arco nas man'as aves ferir,
a las aves meu anigo.
En nas ribas do lago, u eu vi andar,
seu arco na mãao a las aves tirar,
a las aves meu amigo.
Seu arco na mãao as aves ferir,
alas que cantavan leixá-las guarir,
a las aves meu amigo.
Se arco na mãao as aves tirar,
a las que cantavam nom nas quer matar,
a las aves meu amigo.
Fernando Esquio , (CV902,CBN 1246)
Vaiamos- vamos
ribas - margens
u - onde
tirar - atirar
guarir- deixá-las sem ferida
Um soneto começo em vosso gabo
Um soneto começo em vosso gabo;
Contemos esta regra por primeira,
Já lá vão duas, e esta é a terceira,
Já este quartetinho está no cabo.
Na quinta torce agora a porca o rabo:
A sexta vá também desta maneira,
na sétima entro já com grã canseira,
E saio dos quartetos muito brabo.
Agora nos tercetos que direi?
Direi, que vós, Senhor, a mim me honrais,
Gabando-vos a vós, e eu fico um Rei.
Nesta vida um soneto já ditei,
Se desta agora escapo, nunca mais;
Louvado seja Deus, que o acabei.
Gregório de Matos
Todo ponto de vista é a vista de um ponto
"Ler significa reler e compreender. Cada um lê
com os olhos que tem. E interpreta a partir de onde os pés pisam. Todo ponto de
vista é a vista de um ponto. Para entender como alguém lê é necessário saber
como são seus olhos e qual a sua visão de mundo. Isso faz da leitura sempre uma
releitura. A cabeça pensa a partir de onde os pés pisam. Para compreender é
essencial conhecer o lugar social de quem olha. Vale dizer: como alguém vive,
com quem convive, que experiência tem, em que trabalha, que desejos alimenta,
como assume os dramas da vida e da morte e que esperanças o animam. Isso faz da
compreensão sempre uma interpretação. Sendo assim, fica evidente que cada
leitor é sempre um co-autor. Porque cada um lê e relê com os olhos que tem.
Porque compreende e interpreta a partir do mundo que habita."
Leonardo Boff
A expressão "com os olhos que tem" (? .1), no texto, tem o sentido de
(A) enfatizar a leitura.
(B) incentivar a leitura.
(C) individualizar a leitura.
(D) priorizar a leitura.
(E) valorizar a leitura.
Texto I e II
Carta (Texto I)
(Fragmento)
A terra não pertence ao
homem; é o homem que pertence à terra. Disso temos certeza. Todas as coisas
estão interligadas, como o sangue que une uma família. Tudo está relacionado
entre si. O que fere a terra fere também os filhos da terra. Não foi o homem
que teceu a trama da vida: ele é meramente um fio da mesma. Tudo que ele fizer
à trama, a si próprio fará. Carta do cacique Seattle ao presidente dos EUA em
1855.
Texto de domínio público distribuído pela ONU.
Dicionário de Geografia (Texto
II)
(Fragmento)
Segundo o geógrafo Milton
Santos: "o espaço geográfico é a natureza modificada pelo homem através do
seu trabalho". E "o espaço se define como um conjunto de formas
representativas de relações sociais do passado e do presente e por uma
estrutura representada por relações sociais que estão acontecendo diante dos
nossos olhos e que se manifestam através de processos e funções".
GIOVANNETTI, G. Dicionário de Geografia.
Melhoramentos, 1996.
Os dois textos diferem, essencialmente, quanto
(A) à abordagem mais objetiva do texto I.
(B) ao público a que se destina cada texto.
(C) ao rigor científico presente no texto II.
(D) ao sentimentalismo presente no texto I.
(E) ao tema geral abordado por cada autor.
Tempo Será:
A Eternidade está longe
(Menos longe que o estirão
Que existe entre o meu desejo
E a palma da minha mão).
Um dia serei feliz?
Sim, mas não há de ser já:
A Eternidade está longe,
Brinca de tempo-será.
(Manuel Bandeira)
Soneto de contrição
Eu te amo,
Maria, eu te amo tanto
Que o meu peito
me dói como em doença
E quanto mais me
seja a dor intensa
Mais cresce na
minha alma teu encanto.
Como a criança
que vagueia o canto
Ante o mistério
da amplidão suspensa
Meu coração é um
vago de acalanto
Berçando versos
de saudade imensa.
Não é maior o
coração que a alma
Nem melhor a
presença que a saudade
Só te amar é
divino, e sentir calma...
E é uma calma
tão feita de humildade
Que tão mais te
soubesse pertencida
Menos seria
eterno em tua vida.
Vinicius de Moraes
Soneto da rosa tardia
Como uma jovem
rosa, a minha amada...
Morena, linda,
esgalga, penumbrosa
Parece a flor
colhida, ainda orvalhada
Justo no
instante de tornar-se rosa.
Ah, porque não a
deixas intocada
Poeta, tu que es
pai, na misteriosa
Fragrância do
seu ser, feito de cada
Coisa tão frágil
que perfaz a rosa...
Mas (diz-me a
Voz) por que deixá-la em haste
Agora que ela é
rosa comovida
De ser na tua
vida o que buscaste
Tão
dolorosamente pela vida ?
Ela é rosa,
poeta... assim se chama...
Sente bem seu
perfume... Ela te ama...
Vinicius de Moraes
Sociedade
O homem disse para o amigo:
— Breve irei a tua casa
e levarei minha mulher.
O amigo enfeitou a casa
e quando o homem chegou com a mulher,
soltou uma dúzia de foguetes.
O homem comeu e bebeu.
A mulher bebeu e cantou.
Os dois dançaram.
O amigo estava muito satisfeito.
Quando foi hora de sair,
o amigo disse para o homem:
— Breve irei a tua casa.
E apertou a mão dos dois.
No caminho o homem resmunga:
— Ora essa, era o que faltava.
E a mulher ajunta: — Que idiota.
— A casa é um ninho de pulgas.
— Reparaste o bife queimado?
O piano ruim e a comida pouca.
E todas as quintas-feiras
eles voltam à casa do amigo
que ainda não pôde retribuir a visita.
Carlos Drummond de Andrade, in 'Alguma Poesia'
Senhora (Fragmento)
Aurélia passava agora as noites solitárias. Raras vezes aparecia Fernando, que arranjava uma desculpa qualquer para justificar sua ausência. A menina que não pensava em interrogá-lo, também não contestava esses fúteis inventos. Ao contrário buscava afastar da conversa o tema desagradável. Conhecia a moça que Seixas retirava-lhe seu amor; mas a altivez de coração não lhe consentia queixar-se. Além de que, ela tinha sobre o amor idéias singulares, talvez inspiradas pela posição especial em que se achara ao fazer-se moça. Pensava ela que não tinha nenhum direito a ser amada por Seixas; e pois toda a afeição que lhe tivesse, muita ou pouca, era graça que dele recebia. Quando se lembrava que esse amor a poupara à degradação de um casamento de conveniência, nome com que se decora o mercado matrimonial, tinha impulsos de adorar a Seixas, como seu Deus e redentor.
Parecerá estranha essa paixão veemente, rica de heróica dedicação, que entretanto assiste calma, quase impassível, ao declínio do afeto com que lhe retribuía o homem amado, e se deixa abandonar, sem proferir um queixume, nem fazer um esforço para reter a ventura que foge. Esse fenômeno devia ter uma razão psicológica, de cuja investigação nos abstemos; porque o coração, e ainda mais o da mulher que é toda ela, representa o caos do mundo moral. Ninguém sabe que maravilhas ou que monstros vão surgir nesses limbos.
ALENCAR, José de. Capítulo VI. In: __. Senhora. São Paulo: FTD, 1993. p. 107-8.
Parecerá estranha essa paixão veemente, rica de heróica dedicação, que entretanto assiste calma, quase impassível, ao declínio do afeto com que lhe retribuía o homem amado, e se deixa abandonar, sem proferir um queixume, nem fazer um esforço para reter a ventura que foge. Esse fenômeno devia ter uma razão psicológica, de cuja investigação nos abstemos; porque o coração, e ainda mais o da mulher que é toda ela, representa o caos do mundo moral. Ninguém sabe que maravilhas ou que monstros vão surgir nesses limbos.
ALENCAR, José de. Capítulo VI. In: __. Senhora. São Paulo: FTD, 1993. p. 107-8.
O narrador revela uma opinião no trecho
(A) "Aurélia passava agora as noites solitárias.
(B) "...buscava afastar da conversa o tema desagradável.
(C) "...tinha impulsos de adorar a Seixas, como seu Deus.
(D) "...e se deixa abandonar, sem proferir um queixume.
(E) "Esse fenômeno devia ter uma razão psicológica.
(A) "Aurélia passava agora as noites solitárias.
(B) "...buscava afastar da conversa o tema desagradável.
(C) "...tinha impulsos de adorar a Seixas, como seu Deus.
(D) "...e se deixa abandonar, sem proferir um queixume.
(E) "Esse fenômeno devia ter uma razão psicológica.
Ritual da madrugada
Augusta era
fada.
Com varinha
mágica tecia:
estrelas nas
colchas
trepadeiras nas
janelas.
Às três da manhã
penteava o
cabelo
comprido,
comprido...
passava o pente
vagarosamente
e vagarosamente
tecia a trança.
_ Trança de
fada.
( Canção da menina descalça -
Iêda Dias)
Retrato
"Eu não
tinha este rosto de hoje,
assim calmo,
assim triste, assim magro,
nem estes olhos
tão vazios, nem o lábio amargo.
Eu não tinha
estas mãos sem força,
tão paradas e
frias e mortas;
eu não tinha
este coração que nem se mostra.
Eu não dei por
esta mudança,
tão simples, tão
certa, tão fácil:
Em que espelho
ficou perdida a minha face?"
Cecília Meireles
O tema do texto é
(A) a consciência súbita sobre o envelhecimento.
(B) a decepção por encontrar-se já fragilizada.
(C) a falta de alternativa face ao envelhecimento.
(D) a recordação de uma época de juventude.
(E) a revolta diante do espelho.
REMÉDIO NO CÉU É SEMPRE MAIS BARATO
E deu-se que o capitão
Nicolino Borba, de Sacopé de Monte Verde, sentiu uma agulhada no peito, caiu e
dado como morto foi. Quando era levado paro o cemitério, eis que o capitão
dosabrochou por entre flores e grinaldas aos berros e já fazendo inquirições.
Como era muito usurário, de não dar bom dia para não gastar o solado da língua,
logo entrou de perguntativo em pauta:
- Que negócio é este? Que
despautério é este? Enterro de primeira com caixão de veludinho e um jasmim de
rosas por cima, é para estuporar. É despesa muita para um defunto só.
Desperdício!
Correu gente, veio médico
de maleta na mão e no caixão mesmo examinou o usurário. Logo na primeira ouvida
que aplicou na armação dos peitos de Nicolino, viu que andava bem vivo e em bom
estado de uso. E aproveitou para falar dos perigos que o capitão corria. E com
autoridade de receitador de poções:
- Desta vez o capitão
escapou. Mas lhe digo que não vai muito longe se não fizer tratamento urgente,
como requer sua doença. É o que lhe digo. Não vai muito longe. Bem encastoado
no veludo do caixão, Nicolino perguntou:
- Se não é falta de
respeito, doutor, em quanto fica essa medicina?
O médico, rapidinho,
colocou a mazela de Nicolino na máquina de somar e apresentou a conta:
- Oitocentos contos para
um tratamento completo.
E Nicolino:
- Toca o enterro, minha
gente. Por esse preço prefiro morrer, que remédio no céu é mais barato.
José Cândido de Carvalho
A cidade do Óbvio
É fácil localizar a cidade do óbvio. Ela fica exatamente onde você esperasse que ela ficasse, e inclusive, está identificada no mapa pela palavra "Óbvio". Quem for de carro deve seguir as indicações na estrada até chegar aonde quer ir: é Óbvio. Pode-se ir de ônibus, tendo o cuidado de pegar um ônibus que não vá para outro lugar, ou de trem, desde que se desça na estação certa. O nome da cidade, Óbvio, está escrito na estação com letras. Se o nome na estação for outro, não é Óbvio. É claro.
Em Óbvio tem uma praça central onde fica a igreja matriz e a prefeitura. A igreja é usada pra missas, enquanto a administração da cidade se concentra convenientemente na prefeitura.
Apesar de certa mesmice, as casa de Óbvio, todas feitas com material de construção, se distinguem por certos detalhes arquitetônicos, como janelas e portas que abrem e fecham. Existem ruas. A cidade é cheia de lugares comuns.
Em Óbvio conversa-se pouco. Primeiro, porque desde a fundação da cidade ninguém jamais teve um pensamento original e os assuntos se repetem. Segundo, porque as pessoas não precisam dizer nada. Em Óbvio, está tudo na cara.
Óbvio fica logo depois de Evidente para quem vai a Redundância.
Os principais produtos da região são os truísmos e as coisas feitas ali mesmo. Quando a temperatura baixa, faz frio, mas os termômetros sobem quando esquenta.
E Óbvio tem uma peculiaridade quanto ao clima, lá só chove no molhado.
Em Óbvio tem uma praça central onde fica a igreja matriz e a prefeitura. A igreja é usada pra missas, enquanto a administração da cidade se concentra convenientemente na prefeitura.
Apesar de certa mesmice, as casa de Óbvio, todas feitas com material de construção, se distinguem por certos detalhes arquitetônicos, como janelas e portas que abrem e fecham. Existem ruas. A cidade é cheia de lugares comuns.
Em Óbvio conversa-se pouco. Primeiro, porque desde a fundação da cidade ninguém jamais teve um pensamento original e os assuntos se repetem. Segundo, porque as pessoas não precisam dizer nada. Em Óbvio, está tudo na cara.
Óbvio fica logo depois de Evidente para quem vai a Redundância.
Os principais produtos da região são os truísmos e as coisas feitas ali mesmo. Quando a temperatura baixa, faz frio, mas os termômetros sobem quando esquenta.
E Óbvio tem uma peculiaridade quanto ao clima, lá só chove no molhado.
Autor: Luís Fernando Veríssimo.
ORAÇÃO SEM NOME
O autor desse poema, quem o sabe?
Foi encontrado em pleno campo de batalha,
no bolso de um soldado americano desconhecido;
do rapaz estraçalhado por uma granada,
restava penas intacta esta folha de papel.
Escuta Deus:
Jamais falei
contigo.
Hoje quero
saudar-te. Bom dia! Como vais?
Sabes?
Disseram-me que tu não existes,
E eu, tolo,
acreditei que era verdade.
Nunca havia
reparado a tua obra.
Ontem à noite,
da trincheira rasgada por granadas,
vi teu céu
estrelado
e compreendi
então que me enganaram.
Não sei se
apertarás a minha mão.
Vou te explicar
e hás de compreender.
É engraçado:
Neste inferno hediondo
Achei a luz para
enxergar o seu rosto.
Digo isto, já
não tenho muita coisa a te contar:
Só que... que...
tenho muito prazer em conhecer-te.
Faremos um
ataque à meia-noite.
Não sinto medo.
Deus, sei que tu
velas...
Ah! É o clarim!
Bom Deus, devo ir embora.
Gostei de ti...
vou ter saudade... quero dizer:
Será cruenta a
luta, bem o sabes,
E esta noite
pode ser que eu vá bater-te à porta!
Muito amigo não
fomos, é verdade.
Mas... sim,
estou chorando!
Vês, Deus, penso
que já não sou tão mau.
Bem, Deus, tenho
que ir.
Sorte é coisa
bem rara:
Juro, porém: já
não receio a morte.
“As mais belas orações de
todos os tempos”
ALPHEU TERSARIOL
O torcedor
No jogo de decisão do campeonato, Eváglio torceu pelo
Atlético Mineiro, não porque fosse atleticano ou mineiro, mas porque receava o
carnaval nas ruas se o Flamengo vencesse. Visitava um amigo em bairro distante,
nenhum dos dois tem carro, e ele previa que a volta seria problema.
O Flamengo triunfou, e Eváglio deixou de ser atleticano
para detestar todos os clubes de futebol, que perturbam a vida urbana com suas
vitórias. Saindo em busca de táxi inexistente, acabou se metendo num ônibus em
que não cabia mais ninguém, e havia duas bandeiras rubro-negras para cada
passageiro. E não eram bandeiras pequenas nem torcedores exaustos: estes
pareciam terem guardado a capacidade de grito para depois da vitória.
Eváglio sentiu-se dentro do Maracanã, até mesmo dentro
da bola chutada por 44 pés. A bola era ele, embora ninguém reparasse naquela
esfera humana que ansiava por tornar a ser gente a caminho de casa.
Lembrando-se de que torcera pelo vencido, teve medo,
para não dizer terror. Se lessem em seu íntimo o segredo, estava perdido. Mas
todos cantavam, sambavam com alegria tão pura que ele próprio começou a sentir
um pouco de flamengo dentro de si. Era o canto? Eram braços e pernas falando
além da boca? A emanação de entusiasmo o contagiava e transformava. Marcou com
a cabeça o acompanhamento da música. Abriu os lábios, simulando cantar. Cantou.
Ao dar fé de si, disputava à morena frenética a posse de uma bandeira. Queria
enrolar-se no pano para exteriorizar o ser partidário que pulava em suas
entranhas. A moça, em vez de ceder o troféu, abraçou-se com Eváglio e beijou-o
na boca. Estava batizado, crismado e ungido: uma vez Flamengo, sempre Flamengo.
O pessoal desceu na Gávea, empurrando Eváglio para
descer também e continuar a festa, mas Eváglio mora em Ipanema, e já com o pé
no estribo se lembrou. Loucura continuar flamengo a noite inteira à base de
chope, caipirinha, batucada e o mais. Segurou firme na porta, gritou: "Eu
volto, gente! Vou só trocar de roupa" e, não se sabe como, chegou intacto
ao lar, já sem compromisso clubista.
(ANDRADE, Carlos Drummond. De conto em conto, v. 2.
São Paulo: Ática, 2001.)
O segredo da felicidade
Certo mercador enviou seu filho para aprender o
segredo da felicidade do homem mais sábio do mundo. O menino vagou pelo deserto
por 40 dias, e finalmente chegou a um belo castelo, no alto de uma montanha.
Foi aí que o sábio morava.
Ao invés de encontrar um homem santo, porém, nosso
herói, ao entrar na sala principal do castelo, vi um ramo de atividade:
comerciantes entravam e saíam, pessoas conversavam pelos cantos, uma pequena
orquestra tocava melodias suaves, e havia uma mesa coberta de pratos de comida
mais deliciosa que parte do mundo. O homem sábio conversava com todos, eo rapaz
teve que esperar duas horas antes que era sua vez de ser dada a atenção do
homem.
O sábio ouviu atentamente a explicação do menino
porque ele tinha chegado, mas disse que ele não teve tempo apenas depois de
explicar o segredo da felicidade. Sugeriu que o rapaz olha em volta do palácio
e retornar em duas horas.
"Entretanto, quero lhe pedir para fazer alguma
coisa", disse o sábio, entregando ao rapaz uma colher de chá que segurava
duas gotas de óleo. "Como você anda, carregue esta colher sem deixar que o
óleo seja derramado".
O rapaz começou a subir e descer as escadarias do
palácio, mantendo sempre os olhos fixos na colher. Depois de duas horas,
retornou para o quarto onde estava o sábio.
"Bem", perguntou o sábio, "você viu as
tapeçarias da Pérsia que estão na minha sala de jantar? Viu o jardim que levou
o mestre jardineiro dez anos para criar? Reparou nos belos pergaminhos de minha
biblioteca? "
O rapaz, envergonhado, confessou que não tinha nada
observado. Sua única preocupação era não derramar as gotas de óleo que o Sábio
lhe havia confiado.
"Então vá para trás e observar as maravilhas do
meu mundo", disse o sábio. "Você não pode confiar num homem se não conhece
sua casa".
Aliviado, o rapaz pegou a colher e voltou para sua
exploração do palácio, desta vez reparando em todas as obras de arte nos tectos
e nas paredes. Viu os jardins, as montanhas ao redor, a beleza das flores, o
requinte com que tudo tinha sido selecionada. Ao voltar para o sábio, relatou
pormenorizadamente tudo que havia visto.
"Mas onde estão as duas gotas de óleo de lhe
confiei?" perguntou o sábio. Olhando para a colher, o rapaz viu que o óleo
foi.
"Bem, só existe um conselho que lhe posso dar",
disse o mais sábio dos sábios. "O segredo da felicidade é ver todas as
maravilhas do mundo e nunca esquecer as duas gotas de óleo na colher."
Paulo Coelho in, O Alquimista.RJ, 1992
O PÁSSARO CATIVO
Armas, num galho de árvore, o alçapão.
E, em breve, uma avezinha descuidada, batendo as asas
cai na escravidão.
Dás-lhe então, por esplêndida morada, a gaiola
dourada.
Dás-lhe alpiste, e água fresca, e ovos, e tudo.
Por que é que, tendo tudo, há de ficar o passarinho
mudo, arrepiado e triste, sem cantar?
É que, criança, os pássaros não falam.
Só gorgeando a sua dor exalam, sem que os homens os
possam entender.
Se os pássaros falassem,
talvez os teus ouvidos escutassem este cativo pássaro
dizer:
"Não quero o teu alpiste!
Gosto mais do alimento que procuro na mata livre em
que a voar me viste.
Tenho água fresca num recanto escuro.
Da selva em que nasci; da mata entre os verdores,
tenho frutos e flores, sem precisar de ti!
Não quero a tua esplêndida gaiola!
Pois nenhuma riqueza me consola de haver perdido
aquilo que perdi...
Prefiro o ninho humilde, construído de folhas secas,
plácido, e escondido.
Entre os galhos das árvores amigas...
Solta-me ao vento e ao sol!
Com que direito à escravidão me obrigas?
Quero saudar as pompas do arrebol!
Quero, ao cair da tarde, entoar minhas tristíssimas
cantigas!
Por que me prendes? Solta-me, covarde!
Deus me deu por gaiola a imensidade!
Não me roubes a minha liberdade...
QUERO VOAR! VOAR!..."
Estas coisas o pássaro diria, se pudesse falar.
E a tua alma, criança, tremeria, vendo tanta aflição.
E a tua mão, tremendo, lhe abriria a porta da
prisão...
Olavo Bilac
O mineirinho
O mineirinho se
chega pro chefe da estação, com aquela calma que Deus lhe deu, palitinho no
canto da boca canivetinho limpando as unhas,
Pergunta:
_ Moço,
Expressojá passou
_ já, sim Senhor
_ É o trêm do
suburguio?
_ Passou às 8:30
_ É o trêm da
carga!
_ Só passa à
meia noite
_ Quer dizer que
não tem nem um trêm agora?
_ Não Senhor
_ Nem manobrano?
_ Não _ Berrou o
chefe, já inrritado
_ Por que? O
Senhor vai viajar?
_ Não, quero
atravessar a linha
Ziraldo
O medo do menino
Que barulho
estranho,
vem lá de fora,
vem lá de
dentro?!
Que barulho
medonho
no forro,
no porão,
na cozinha,
ou na
despensa!...
Será fantasma
ou alma penada ?
Será bicho
furioso
ou barulhinho de
nada ?
E o menino olha
na escura escada
e não vê nada.
Travesseiro
E olha na
vidraça
e uma sombra o
ameaça.
Quem se esconde
?
Esconde onde?
Se vem alguém
passo a passo
Na rua deserta
O medo aumenta.
Passos de gente
de casa
Encolhe o medo.
Se somem vozes e
passos
De gente de
casa,
No ato, no
quarto,
Vem o arrepio .
E o menino
encolhe,
Fica todo
enroladinho.
E se embrulha
nas cobertas,
Enfia a cabeça
no travesseiro
E devagar,
devagarinho,
Sem segredo,
Vem o sono .
E some o medo.
Elias José
O Lobo e o Cordeiro
Estava o cordeiro a beber água num córrego, quando
apareceu um lobo esfaimado, de horrendo aspecto.
─ Que desaforo é esse de turvar a água que venho
beber? ─ disse o monstro, arreganhando os dentes. ─ Espere que vou castigar
tamanha má-criação!...
O cordeirinho, trêmulo de medo, respondeu com
inocência:
─ Como posso turvar a água que o senhor vai beber se
ela corre do senhor para mim?
Era verdade aquilo e o lobo atrapalhou-se com a
resposta, mas não deu o rabo a torcer.
─ Além disso ─ inventou ele ─ sei que você andou
falando mal de mim no ano passado.
─ Como poderia falar mal do senhor o ano passado, se
nasci este ano?
Novamente confundido pela voz da inocência, o lobo
insistiu:
─ Se não foi você foi seu irmão mais velho, o que dá
no mesmo.
─ Como poderia ser seu irmão mais velho, se sou filho
único?
O lobo, furioso, vendo que com razões claras não
venceria o pobrezinho, veio com razão de lobo faminto:
─ Pois se não foi seu irmão, foi seu pai ou seu avô!
E ─ nhoque ─ sangrou-o no pescoço.
(Monteiro Lobato)
1. Qual a real intenção do lobo?
2. Como reage o cordeirinho diante das calúnias do
lobo?
3. Quais as armas do lobo para se sair vitorioso?
4. Interprete o provérbio da fábula e escreva pelo
menos duas outras frases que poderiam substituí-lo.
5. Se, de acordo com o ponto de vista do lobo, o forte
sempre vence pois o mundo é dos espertos, como seria a história contada do
ponto de vista do cordeiro??
6. Reescreva a história , criando um outro ponto de
vista. Como o cordeiro poderia ganhar do lobo? Elabore então uma situação , um
diálogo e a linha moral do final, pensando na perspectiva do cordeiro.
O HOMEM E A GALINHA
Era uma vez um homem que tinha uma galinha. Era uma
galinha como as outras.
Um dia a galinha botou um ovo de ouro. O homem ficou
contente. Chamou a mulher:
- Olha o ovo que a galinha botou.
A mulher ficou contente:
- Vamos ficar ricos!
E a mulher começou a tratar bem da galinha. Todos os
dias a mulher dava mingau para a galinha. Dava pão-de-ló, dava até sorvete. E
todos os dias a galinha botava um ovo de ouro. Vai que o marido disse:
- Pra que esse luxo com a galinha? Nunca vi galinha
comer pão-de-ló... Muito menos tomar sorvete!
- É, mas esta é diferente! Ela bota ovos de ouro!
O marido não quis conversa:
- Acaba com isso mulher. Galinha come é farelo.
Aí a mulher disse:
- E se ela não botar mais ovos de ouro?
- Bota sim - o marido respondeu.
A mulher todos os dias dava farelo à galinha. E a
galinha botava um ovo de ouro. Vai que o marido disse:
- Farelo está muito caro, mulher, um dinheirão! A
galinha pode muito bem comer milho.
- E se ela não botar mais ovos de ouro?
- Bota sim - o marido respondeu.
Aí a mulher começou a dar milho pra galinha. E todos
os dias a galinha botava um ovo de ouro. Vai que o marido disse:
- Pra que esse luxo de dar milho pra galinha? Ela que
procure o de-comer no quintal!
- E se ela não botar mais ovos de ouro? - a mulher
perguntou.
- Bota sim - o marido falou.
E a mulher soltou a galinha no quintal. Ela catava
sozinha a comida dela. Todos os dias a galinha botava um ovo de ouro. Uma dia a
galinha encontrou o portão aberto. Foi embora e não voltou mais.
Dizem, eu não sei, que ela agora está numa boa casa
onde tratam dela a pão-de-ló.
(Ruth Rocha)
1) O texto recebe o título de O homem e a galinha. Por que a história recebe esse título?
a) Porque eles são os personagens principais da
história narrada.
b) Porque eles representam, respectivamente, o bem e o
mal na história.
c) Porque são os narradores da história.
d) Porque ambos são personagens famosos de outras
histórias.
e) Porque representam a oposição homem-animal.
2) Qual das afirmativas a seguir não é correta em
relação ao homem da fábula?
a) É um personagem preocupado com o corte de gastos.
b) Mostra ingratidão em relação à galinha.
c) Demonstra não ouvir as opiniões dos outros.
d) Identifica-se como autoritário em relação à mulher
e) Revela sua maldade nos maus-tratos em relação à
galinha.
3) Qual das características a seguir pode ser
atribuída à galinha?
a) avareza
b) conformismo
c) ingratidão
d) revolta
e) hipocrisia
4) Era uma vez um homem que tinha uma galinha. De que outro modo poderia ser dita a
frase destacada?
a) Era uma vez uma galinha, que vivia com um homem.
b) Era uma vez um homem criador de galinhas.
c) Era uma vez um proprietário de uma galinha.
d) Era uma vez uma galinha que tinha uma propriedade.
e) Certa vez um homem criava uma galinha.
5) Era uma vez é uma expressão que indica tempo:
a) bem localizado
b) determinado
c) preciso
d) indefinido
e) bem antigo
6) A segunda frase do texto diz ao leitor que a
galinha era uma galinha como as outras. Qual o significado dessa frase?
a) A frase tenta enganar o leitor, dizendo algo que
não é verdadeiro.
b) A frase mostra que era normal que as galinhas
botassem ovos de ouro.
c) A frase indica que ela ainda não havia colocado
ovos de ouro.
d) A frase mostra que essa história é de conteúdo
fantástico.
e) A frase demonstra que o narrador nada conhecia de
galinha.
7) O que faz a galinha ser diferente das demais?
a) Botar ovos todos os dias independentemente do que
cofnia.
b) Oferecer diariamente ovos a seu patrão avarento.
c) Pôr ovos de ouro antes da época própria.
d) Botar ovos de ouro a partir de um dia determinado.
e) Ser bondosa, apesar de sofrer injustiças.
8) O homem ficou contente. O conteúdo dessa frase
indica um (a):
a) causa
b) modo
c) explicação
d) conseqüência
e) comparação
9) A presença de travessões no texto indica:
a) a admiração da mulher
b) a surpresa do homem
c) a fala dos personagens
d) a autoridade do homem
e) a fala do narrador da história
10) Que elementos demonstram que a galinha passou a receber um bom tratamento, após botar o
primeiro ovo de ouro?
a) pão-de-ló / mingau / sorvete
b) milho / farelo / sorvete
c) mingau / sorvete / milho
d) sorvete / farelo / pão-de-ló
e) farelo / mingau / sorvete
11) Dizem, eu não sei... Quem é o responsável por
essas palavras?
a) o homem
b) a galinha
c) o narrador
d) a mulher
e) o ovo
Gabarito dos exercícios de interpretação
1-a, 2-e, 3-b, 4-c, 5-d, 6-c, 7-d, 8-d, 9-c, 10-a,
11-c
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